Na Turquia com COVID-19: a minha aventura
São 2h30 da manhã quando acordo sobressaltada. Estou numa cama, mas não na minha em Coimbra. Na verdade, estou num quarto de hotel, na Capadócia, a capital turca do turismo. Esta é a última noite antes de apanhar o voo de volta para Istambul e, de seguida, para Portugal. Ou seria a última noite, não fosse a chamada que fizeram para o meu quarto mudar completamente o rumo da minha vida nas próximas duas semanas.
Atendo o telefone e, no meio da confusão inerente de alguém que acabou de acordar a meio da noite, consigo perceber umas palavras-chave: “your test came back positive”. Sim, o pior cenário aconteceu: tenho COVID-19.
Os meus pais estão, é claro, em choque. Eu nem sei o que pensar ou o que sentir. Há tantas perguntas que preciso de fazer… mas recebo instruções para voltar a ligar às 8h da manhã. Nas 5h de espera consigo dormir um bocadinho, ainda que com pesadelos com toda a situação. A manhã seguinte é um misto de conversas com os funcionários do hotel, pedidos incessantes para repetir o teste, muita pesquisa no google e, acima de tudo, um grande turbilhão de emoções.
Metade da minha família é recambiada para Portugal. Já estão todos vacinados, incluído eu: só que para mim faltam 5 dias para o certificado digital ficar válido, pois fui a última a receber a segunda dose. A cinco dias da liberdade e fico com COVID na Turquia… é caso para dizer que é preciso ter azar.
Durante vários dias recebo imensas informações contraditórias: sim, podes fazer um segundo teste amanhã. Não, afinal só daqui a 5 dias. Ups, parece que não vais fazer teste e tens de fazer quarentena de 10 dias. Ah, espera lá, afinal é de 14!...
Logicamente, isto deu comigo em louca nos primeiros tempos. As únicas pessoas que falavam inglês eram os funcionários do hotel - ninguém da área da saúde conseguia comunicar comigo e por isso tinha sempre de depender da boa vontade dos meus intermediários para saber alguma coisa.
No final de contas, ficou assente que eu ficaria no hotel durante 14 dias em isolamento profilático (não incluindo o dia do meu teste). Foram-me oferecidos uns comprimidos que o governo turco dá sempre aos infetados de COVID e tive também acesso a uma aplicação na qual é possível ver se a pessoa está infetada ou não, assim como os dias restantes da quarentena. A parte engraçada, e também bastante ridícula, é que segundo a aplicação quem tinha COVID era o meu pai e eu estava completamente livre de risco!
Relativamente à minha alimentação, na Capadócia, a maioria esmagadora dos restaurantes é de comida típica turca. Apesar de haver pratos muito bons, tudo o que é demais cansa e eu estava absolutamente FARTA. Não havia praticamente pratos de peixe à venda, e era tudo à base dos mesmos temperos fortes e de carne vermelha. Escolher o meu almoço e jantar era sempre um filme porque eu estava enjoada de tudo e não tinha cozinha para fazer qualquer coisa a meu gosto - quase que até sonhava com uma simples massa de atum! Lá para o final consegui descobrir no google uns restaurantes chineses, que foi o que me valeu. Todavia, tenho de confessar que o pequeno-almoço do hotel não era nada mau. No entanto, nunca nada me soube tão bem quanto a bifana que comi no Porto, na minha primeira refeição em Portugal depois de três semanas na Turquia!
O único prato do qual não me cansei, e acho impossível cansar, foi a sopa de lentilhas do hotel. Opá. Que maravilha. Que delícia! Não a voltei a comer desde o final desta aventura, mas posso dizer que tenho muitas saudades. Acho que se tornou a minha sopa favorita de sempre e não vou descansar enquanto não a conseguir replicar aqui!
A verdade é que tive muita, muita sorte na minha aventura. Passei os 14 dias super bem de saúde, chegando o pessoal do hotel a opinar que devia ter sido um falso positivo. Esse mesmo pessoal do hotel foi sempre impecável comigo, mega simpáticos e prestáveis. Os quartos do hotel eram muito confortáveis e os preços não eram demasiado assustadores. Para além disto, o meu pai tinha trazido o seu computador, por isso a minha quarentena foi completamente passada a ver Netflix, trabalhar no blog e a seguir vídeos de exercício físico no youtube. Isto fez uma diferença brutal - apesar de me aborrecer, não consigo imaginar como me sentiria só com o meu telemóvel e um livro durante 14 dias seguidos. É claro, também documentei tudo o que me acontecia: desde os cânticos que era forçada a ouvir cinco vezes por dia (incluíndo um às 5h da manhã que me acordava todas as noites) até aos gatos que iam aparecendo à minha janela para me fazer companhia. Tudo era digno de partilha porque, francamente, não tinha grande coisa para fazer.
No dia de regresso, a aplicação turca dizia ainda que o meu pai tinha COVID… o voo era às 3h da manhã e eu já só imaginava mandarem-nos de volta para o hotel. Felizmente, só ligaram aos certificados de vacinação e passámos sem qualquer problema. Fiz a viagem para Portugal de direta: à 1h da manhã saímos do hotel, às 3h da manhã apanhámos voo até Istambul, às 7h voo até ao Porto e por volta das 12h comboio do Porto até Coimbra. Isto, aliado com o facto de que na Turquia o fuso horário acrescenta 2h, significa que eu estava completamente arruinada quando cheguei a casa. Arruinada, mas felicíssima e super aliviada!
Ter COVID-19 não é muito divertido, e muito menos foi fazer quarentena na Turquia e gastar uma pipa de massa. No entanto, tal como já disse, tive uma sorte do caraças em muitos aspetos. A minha viagem à Turquia foi talvez a minha viagem favorita de sempre e foi impossível não sentir gratidão por isso, mesmo quando estava presa no quarto, a milhares de quilómetros de casa. Viajar, no final de contas, é tudo: o bom e o mau, incluindo os azares. Especialmente quando esses azares se tornam também em aventuras e em histórias para contar!
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